O vento soprava frio naquela manhã de outono, o barulho das folhas secas abafava o som dos pequenos animais à procura de abrigo e comida. O cheiro de terra molhada e as poças de lama denunciavam que chovera na noite anterior, o que seria um inconveniente para alguém perambulando pela floresta. Mas, para um caçador experiente, nem mesmo as intempéries da natureza o separariam de sua presa.
Dinc subiu numa árvore cuidadosamente para não chamar a atenção do monstro, acomodou-se em um galho mais resistente e apertou os olhos para vê-lo melhor. A fera dormia em seu covil, o ronco ruidoso era audível mesmo àquela distância, o caçador imaginou que a criatura se alimentara a pouco tempo e estava repousando. Calculou que poderia acertá-la dali com uma flecha, bastaria um tiro preciso para por fim à besta.
A ansiedade se apoderou de Dinc, esperara muito por uma oportunidade como aquela; seguira os rastros da criatura por semanas, mantendo-se sempre a uma distância segura, aguardando o momento certo para alvejá-la. Sempre soube que não poderia enfrentá-la de perto, ela era mais rápida e bem mais forte do que ele, muitos de sua tribo haviam cometido esse erro e estavam mortos. "Todos mortos", era exatamente por isso que ele estava ali: para honrar a memória daqueles que foram assassinados pela criatura trazendo-lhe justiça.
O caçador tirou uma flecha da aljava e embebeu sua ponta com veneno, fora o xamã da tribo que preparara aquela mistura especialmente para esta ocasião. Dinc, então, pegou o arco e testou a corda, era o mesmo com o qual treinara durante dias inteiros antes de começar esta jornada. Com arco e flecha em mãos, retesou a corda e mirou; a mão direita tremia levemente ao lado do seu ouvido enquanto gotas de suor formavam-se em seu rosto. Com o olhar fixo no alvo, ele disparou.
A seta atravessou o ar fazendo um zunido baixo até atingir o estômago da criatura. Não houve urros de dor ou expressões de agonia, apenas um espasmo rápido e o sangue escorrendo. Dinc quase não acreditou: sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo, seguido de uma grande sensação de alívio. O caçador teve vontade de ir até o corpo e arrancar uma prova de seu feito, mas não era seguro: logo haveriam outras criaturas perigosas próximo ao corpo. Teve que se contentar apenas com a visão de sua presa abatida. Desceu a árvore cuidadosamente e partiu de volta pra casa.
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A notícia rapidamente se espalhara por todas as cidades ao longo da Estrada Oeste: o famoso mercenário Redgar, conhecido como "o exterminador de goblins", fora assassinado com uma flecha envenenada na estalagem onde estava hospedado. Muitos suspeitaram que tenha sido um acerto de contas de algum marido enciumado, já que Redgar tinha um fraco incorrigível por mulheres. O mercenário fora enterrado com honrarias no condado de Riverstone devido às "contribuições que fizera para deixar as estradas mais seguras".
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Dinc foi recebido como um herói em sua tribo: todos lhe cumprimentaram e agradeceram, alguns ofereceram presentes e outros se curvaram enquanto ele passava. Na noite seguinte, houve um grande banquete: comida, bebida e diferentes versões de seu feito não faltaram na mesa. O chefe da tribo fez um grande discurso sobre a coragem do caçador e ofereceu-lhe sua filha como esposa. A história logo se espalhou de uma tribo para outra e em poucas semanas não havia um goblin num raio de muitas milhas que não conhecesse a história de Dinc, o goblin justiceiro.
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Este é meu texto do mês de maio para a Liga Narrativa - à qual me "associei" recentemente. Cada mês é sugerido um tema para os integrantes criarem um texto sobre ele. O tema do mês de maio foi "herói".
Segue abaixo os textos de outros membros sobre esse tema:
- Sobre fantasmas e heróis
- Liga Narrativa – E se?
- Liga Narrativa (Mai – Heroi): O Cara
- Outro dia de trabalho