28 de jul. de 2008

Disciplina

Ragorth caminhou a passos hesitantes em direção à pequena gruta. Olhou para o céu poente, certo de que não teria uma agradável noite de sono, e entrou. A gruta era ocupada por seu senhor, alguém a quem Ragorth temia, respeitava e admirava incondicionalmente. Não havia nenhuma iluminação dentro, mas nenhum dos dois precisava de luz para enxergar. Assim que avistou o dono da gruta em seu assento de pedra, Ragorth se postou de joelhos.

- Traz-me notícias, tenente? - a voz reverberou na escuridão da gruta.

- Si-sim, meu senhor.

- Assumo que os seus homens já lidaram com os gnolls, estou certo?

- Sim, meu senhor. Os gnolls não serão mais problema.

- Não, os gnolls não, mas algo mais será, não é mesmo?

A insinuação atingiu o tenente Ragorth como uma flecha, por um instante ele sentiu uma vertigem se apoderá de seus sentidos, mas sabia que mesmo trazendo más notícias ele não podia hesitar, não podia demonstrar fraqueza. Demorou apenas um instante para se recobrar e responder:

- Tivemos problemas, meu senhor. Um grupo de viajantes, certamente mercenários ou aventureiros, atravessou a região e matou meia dúzia dos nossos batedores. Eles rumaram para...

- Deixe-me ver se entendi direito: esses viajantes passaram por nossos domínios, mataram alguns de seus homens e saíram ilesos. Foi isso que aconteceu, tenente? - a calma inabalável em suas palavras apenas deixava Ragorth mais temeroso.

- T-temo que sim, meu senhor.

- Algum de seus homens foi levado como prisioneiro?

- Não, meu senhor.

A figura levantou subitamente de seu assento e avançou com sua mão pesada no pescoço do tenente. Uma manopla de aço apertou-lhe a garganta com uma força sobre-humana. Ragorth tentava inutilmente respirar quando foi arremessado ao chão. Depois, uma pesada bota metálica começou a atingir violenta e sucessivamente o seu rosto, quebrando o seu nariz e cobrindo os seus olhos de sangue. O tenente já não conseguia mais ver o mundo ao seu redor. Quando achou que a dor não poderia piorar, ouviu o seu senhor tirar o chicote preso ao cinto.

As chibatas vieram fortes e contínuas. Para Ragorth, parecia que, a cada golpe, uma dúzia de lanças perfurava a sua pele. Depois do que pareceu uma eternidade sob açoite, as chicotadas cessaram. O tenente não acreditou que estava vivo. Seu corpo estava em brasas e a dor mal permitia que ele se mexesse. Seu senhor ofereceu a mão para ajudá-lo a levantar.

- Venha, irmão, erga-se. - falou imponente a figura ajudando Ragorth a ficar de pé.

O tenente estendeu o braço e fez um esforço imenso para conseguir levantar.

- O sacerdote Farruk pode ajudá-lo com seus ferimentos... amanhã e apenas amanhã.

Ragorth fez um leve aceno com a cabeça. Queria procurar o sacerdote imediatamente, mas sabia que desobedecer o seu senhor traria consequências bem piores do que as chicotadas que sofreu hoje.

- Tome, levo-o. - falou a Ragorth entregando-lhe o chicote - Seus homens precisam de disciplina.

6 de jul. de 2008

A Floresta do Amanhecer

A Floresta do Amanhecer nem sempre foi conhecida por esse nome. Por muitas anos ela foi chamada de Floresta do Ninho da Aranha e era o lar de numerosas aranhas gigantes que faziam a mata ser temida e evitada. Os habitantes das aldeias próximas sabiam o quão perigoso era o local e por isso evitavam se aproximar da floresta, raramente tendo problemas com as aranhas que a habitavam. Esse quadro, contudo, mudou drasticamente quinze anos atrás, quando pequenos grupos de aranhas começaram a aparecer fora dos limites da mata, atacando o gado e os viajantes da Estrada do Norte.

As terríveis notícias chegaram aos ouvidos de Adennon e dos millikars. O arqui-ranger já andara muito pelas regiões selvagens em torno dos Vales e desconfiava que havia algo não-natural naquela floresta, mas ele nunca conseguira adentrar profundamente na mata, por ela ser muito fechada e as aranhas serem bastante hostis. Dessa vez, contudo, ele não estaria sozinho: mais de trinta millikars decidiram ajudá-lo e vários caçadores e aldeões da região se juntaram ao grupo.

Foram quase três meses de patrulhas e incursões, de ataques e fugas, uma verdadeira guerra foi travada entre homens e aracnídeos. Adennon e os outros descobriram que as criaturas eram comandadas por uma aranha ainda maior que as demais, dotada de grande inteligência e perversidade, Hasgeron era o seu nome.

Uma luta terrível foi travada entre os rangers e a criatura. Vários millikars morreram nesse combate, mas os sobreviventes lutavam com tamanha ferocidade que o número de aliados parecia aumentar, e não diminuir, a cada companheiro caído. O senhor das aranhas, no fim, foi derrotado.

E foi com os primeiros raios da aurora que os sobreviventes chegaram à aldeia mais próxima às bordas da floresta. Eles traziam consigo o corpo de Hasgeron como símbolo de sua vitória. Sua carcaça fétida foi queimada pelos camponeses e enterrada sob uma pilha de pedras e maldições. Sem o comando da malévola criatura, as poucas aranhas restantes fugiram para as montanhas que cercavam a floresta.

Vários aldeões e quase metade dos millikars tombaram no conflito. As mortes foram lamentadas e a vitória comemorada, alegria e tristeza andaram lado-a-lado naqueles que ficaram conhecidos como "os dias do vinho e das lágrimas". Adennon e outros rangers decidiram se fixar na floresta e ajudá-la a se recuperar dos danos causados pela influência de Hasgeron. As vilas próximas estavam seguras novamente.

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Inspirografia:

- Tolkien, J.R.R.
- Forgotten Realms